Educar os filhos hoje não é tarefa das mais fáceis.
Vivemos numa sociedade rodeada hoje de informações e tecnologia que se renovam constantemente e em ritmo acelerado. Como estamos administrando tudo isso?
As mudanças que ocorreram nas últimas décadas, têm afetado não só a vida dos indivíduos como também as relações humanas. Temos hoje uma geração que domina a tecnologia mesmo antes da alfabetização. Alguém tem dúvidas de que o mundo e a cultura das crianças de hoje mudaram?
Qual é o sentido da infância hoje?
Como está o universo imaginário destas crianças?
A infância sempre é um tempo em trânsito, portanto dura muito pouco. Por isso não podemos deixar de nos preocupar com a educação da infância no mundo atual.
Como conviver com o que aprendemos e o que nossos filhos exigem no mundo de hoje?
Hoje, a única coisa que realmente temos certeza absoluta é que tudo neste mundo muda, a uma velocidade tremenda e na maioria das vezes não conseguimos acompanhar. Mas, não podemos nos omitir e precisamos mais do que nunca, tentar aprender com nossos filhos neste mundo atual da comunicação, e administrar este grande desafio que nada mais é do que, aprender a educar numa sociedade em transformação.
A infância é a primeira etapa do desenvolvimento humano, é a fase da imaginação e da fantasia, onde temos o pensamento mágico e posteriormente o pensamento lógico, que se constroem essencialmente pelo “brincar”. O ato de brincar e o imaginário é que dá a dimensão fundamental da vida infantil. Pelo “brincar” a criança aprende a expressar gestos, emoções, interagir e viver entre pares; a conhecer e a integrar-se no meio ambiente em que vive. O brinquedo é a primeira ferramenta que ensina a criança a lidar com o mundo.
O período da infância hoje se mostra diferente, principalmente pela diferença dos comportamentos das crianças a cada dia mais estimuladas precocemente pelo desenvolvimento dos recursos oferecidos pela tecnologia. Mudaram as brincadeiras infantis que estimulavam os diferentes sentidos, a criatividade e a socialização. As atividades comuns na infância estão sendo substituídas pela tecnologia, e perdeu-se parte da comunicação presencial.
Hoje estamos na geração “touch screen”. Ipad para bebê de 3 meses, inglês para bebês de 4 meses, Programa Baby Einstein para bebês a partir de 6 meses.
Vídeo recentemente apresentado nos meios de comunicação mostra criança, que mal aprendeu a andar, mexendo num tablet, com grande desenvoltura e excitação; quando o mesmo é substituído por uma revista, a criança tenta desesperadamente obter os mesmos efeitos do tablet e com o insucesso, aperta várias vezes seu dedinho na perna, pois tem a ideia de que é o seu dedo que parou de “funcionar”. Em seguida há um comentário de Steve Jobs:
“para minha filha de um ano, uma revista é um ipad quebrado, e assim o será para toda sua vida…. Steve Jobs codificou uma parte dela”.
Os pais precisam estimular também, atividades não virtuais na rotina dos filhos porque este equilíbrio favorece e promove a saúde física, emocional e o bom relacionamento social.
Quando discutimos os meios da comunicação moderna, para muitos, a família ainda é o espaço privilegiado da comunicação humana e nunca deixará de ser o principal e mais importante modelo para a humanização dos nossos filhos.
Os pais são analógicos ou imigrantes digitais e os filhos essencialmente digitais. Muitos deles superinformados no mundo virtual, desconhecendo o mundo real.
A internet revolucionou o comportamento humano, aproximamo-nos da família e dos amigos distantes, distanciamo-nos dos mais próximos.
A sociedade moderna tornou as relações familiares mais complexas, afastando as pessoas do convívio, do diálogo e das relações humanas.
As crianças em osmose com o computador e a televisão, estão substituindo o sonho infantil pela ilusão adulta, pulando etapas e confundindo o real com o imaginário. O filho isolado em casa pelos riscos da rua, mas “plugado” nos riscos do mundo virtual.
A essência da comunicação do mundo globalizado é a tecnologia e não satisfaz as necessidades das comunicações afetivas e humanas. Enquanto os adultos usam a palavra como forma fundamental de expressão a linguagem básica da criança é essencialmente comportamental.
A comunicação do amor entre pais e filhos está no olhar, no toque carinhoso, e nas atitudes, essencialmente não verbal. A comunicação não verbal, é a forma básica pela qual as crianças percebem o amor dos pais. Muito do amor que os pais sentem por seus filhos não chega a eles por simples desconhecimento dos problemas de comunicação na educação infantil.
Principais diferenças da Comunicação na Infância na Família Real e na Família Virtual:
A comunicação da infância na família real é essencialmente não verbal, afetiva, precisa de presença, do toque, da aceitação.
Precisa ser construída no dia a dia e com atitudes e preocupação com o outro. Necessita da Inteligência afetiva. Deve ter significado para compreender melhor o mundo. Deve ter ingredientes essenciais para a construção humana. Não pode ser virtual ou abstrata, tem que ser real e concreta. Necessita de interação e diálogo e também não pode ser veículo de mão única.
Precisa de tempo para crescer e não de botão “ON e OFF”.
É imprescindível o espaço para que seja construída e a família ainda é o espaço privilegiado. Precisa da família para o seu equilíbrio e humanização. O fator humano é essencial e importante como formador. A tecnologia não preenche as necessidades básicas do ser humano. Associa-se à necessidades físicas e prazer. Os pais não podem ser simplesmente analógicos e os filhos digitais.
Na família virtual, cadê o mundo real, onde fica o brincar, onde fica o modelo de identificação?
É imprescindível encontrar o equilíbrio nas conexões e redes sociais para não cairmos na Doenças próprias da virtualidade: solidão interativa, isolamento, falta de afeto e obesidade
A família real, ainda é a âncora afetiva, e o lugar onde procuramos conceber e viver os valores essenciais, que sustentam nossa visão da sociedade.
Para reflexão:
- Considero minha família Real ou Virtual?
- Como foi a educação na infância dos meus filhos e a de hoje?
- Qual é a geração dos meus filhos: analógica ou digital?
- Como me considero hoje: Analfabyte, Imigrante Digital ou Nascido Digital?
- Disponho de um espaço privilegiado de comunicação em casa?
- Quanto tempo ficamos conectados com o mundo virtual?
- Participo de redes sociais? Com que critério?
- O que acontece com nossos filhos hoje: vivem, convivem ou dividem o espaço da convivência familiar?
- Como deve ser a relação da criança quanto ao uso da tecnologia durante a sua formação? Tenho consciência dos riscos que envolvem o uso prematuro e não controlado das tecnologias avançadas?
- Como pais, sabemos conciliar o tempo de convivência das brincadeiras normais dito: OFF-LINE, com os períodos: ON-LINE, dos nossos filhos?
- Para a criança, onde está a fronteira entre a realidade e a aparência; entre o real e o virtual?
Conclusão:
Não permitam que nossos filhos, principalmente na infância, percam no lar, o espaço privilegiado da convivência familiar, pois vão acabar conectados com o mundo virtual e desconectados do mundo real… e quando por algum motivo, acabar a conexão, vão perceber que estão isolados e com as doenças próprias do mundo virtual: obesidade, solidão, depressão e falta de afeto.
Referências:
PALFREY, John/GASSER, Urs. Nascidos na era digital. Artmed, 2011.
LEVIN, ESteban. Rumo a uma infância virtual. Vozes. 2007.
REICHERT, Evania. A infância: A idade sagrada. Valle do Ser, 2011.
46º Congresso Nacional da Escola de Pais do Brasil. Família nos tempos que correm. Para onde vai? São Paulo, 2010.
49º Congresso Nacional da Escola de Pais do Brasil: “A Família Educadora no Mundo da Comunicação”. Grupo de Interesse. São Paulo, 2012.
Jean Khater Filho e Ilham El Maerrawi – Conselho de Educadores da Escola de Pais do Brasil. [email protected]
(*) Publicado na Revista Escola de pais do Brasil Seccional de Curitiba, ano 56, ed. 49, setembro 2020, p. 16.