A família é a instituição social mais antiga do planeta. Deveria ser o lugar apropriado para conviver e crescer, para desempenhar as funções de cônjuges, de pais e filhos na transmissão de valores, de boa convivência e solidariedade, herança a ser passada para outras gerações.
O modelo tradicional, nuclear de família, composto de mãe, pai e filho, não é o único existente em nossa sociedade. Essa realidade não pode ser ignorada. A família não é mais a mesma, foi modificando-se em sua estrutura e convivência, que enfrenta crises e conflitos, mas é uma realidade fundamental para a formação da identidade humana e social. A família nuclear (mãe, pai e filho) esteve e permanece presente na maioria das diversas estruturas e dinâmicas familiares, apesar de hoje ser mais difícil identificar sua função e importância, diferente de outros períodos como os de nossos antepassados.
Voltando um pouco na história, a partir da década de 1950, a família foi marcada por transformações sociais e culturais, o que levou a uma maior concentração de renda e exploração de mão-de-obra infantil e feminina. A família vivendo em um ambiente industrial, (migração da área rural para área industrial – cidades) deixou de ser protegida pelo Estado como instituição social, mas passou a ser influenciada pelo mercado de trabalho. A partir de então, todos devem trabalhar para suprir suas necessidades.
Com a Segunda Guerra Mundial, novos e importantes fatos apareceram: tecnologia de informação-comunicação, globalização da economia e acelerado processo de mudanças culturais, este que teve como principal agente de mudança o papel da mulher na família e na sociedade. A mulher deixou de ser apenas a responsável pelos cuidados com o lar, com o marido e filhos para buscar sua realização profissional quer seja por necessidades financeiras ou por realização profissional. Fato este que levou a mulher a reivindicar em casa a divisão de responsabilidades na educação dos filhos e nos afazeres domésticos. Entra em crise o patriarcado. O homem perde sua condição de autoridade e provedor principal, pois os ganhos femininos passaram a compor o orçamento doméstico. Ainda, encontram dificuldade na adaptação ao novo papel de pai mais acessível aos filhos e de esposo mais cooperativo em casa. Em contra partida, a mãe enfrenta o sentimento de culpa por não se dedicar integralmente a casa e aos filhos. A busca de igualdade de direitos e deveres desencadeia a necessidade de reorganização da dinâmica familiar, envolvendo os filhos no processo de acordo com a idade. Um ponto positivo nessa nova dinâmica é a maior convivência e interação dos filhos com a figura paterna.
Outra constatação é que diante da situação de crise e confusão nessa reorganização familiar, quando não encontrado alternativas, acarreta separações acompanhadas de frustração e sofrimento para o casal e filhos se houver.
Nesse processo de modernização com mais valorização do individualismo e da competição, e a partir da dificuldade em distinguir a função e importância dos pais num lar e na vida dos filhos, o trabalho da Escola de Pais do Brasil passou a ter maior valor e importância.
Novos desafios surgem assim como as novas formas de família, dentre as quais duas destacam-se na sociedade brasileira: o monoparental e a de segunda união.
A família monoparental é caracterizada pela presença de apenas um dos pais com seu(s) filho(s). Foi reconhecida como entidade familiar pela Constituição Federal de 1988 no seu artigo 226, parágrafo 4º. Este dispõe que “entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. Sempre existiu mãe solteira, viúvas/os, mulheres sozinhas e crianças abandonadas, mas se intensificou nos últimos 25 anos. A partir da década de 60, verificou-se o maior número de divórcios, uma das causas da monoparentalidade. Outra causa é a opção tanto do homem quanto da mulher adotar uma criança independentemente de seu estado civil, nos termos do artigo 42 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).
No caso das separações, hoje tem-se a opção pela guarda compartilhada, modelo em crescente ascensão. O que é muito bom, pois o ideal é que a criança seja educada e preparada para a vida tendo presentes os modelos de masculinidade e feminilidade. Neste caso, o sucesso depende da maturidade dos pais no atendimento das necessidades básicas dos filhos de amor e segurança.
E a família de segunda união é aquela formada por casais em que um ou ambos já foram casados com outras pessoas e separaram-se. Há ou não filhos do casamento anterior e muitas vezes novos filhos surgem dessa união. Essa nova forma de família, evidenciada a partir dos anos 50, é uma realidade nova e até mesmo acolhida pela Pastoral Familiar da Igreja Católica, tão tradicional no conceito de família e de indissolubilidade do casamento.
A segunda união é uma prova que a família resiste e revigora-se diante das adversidades. São casais criando alternativas de convivência emocional, procurando prevenir as más experiências e sofrimentos já passados, causados em sua maioria por infidelidade conjugal, alcoolismo dos maridos, violência doméstica, discussões, brigas, falta de diálogo etc.
A família em segunda união assim como as outras formas de família, possui seus problemas, seus momentos de tristezas, de alegrias, de esperanças e tensões. O casal vem de diferentes origens, realidades e muitos deles com filhos do casamento anterior, cujos membros também têm diferentes expectativas e padrões de comportamento. Necessário se faz a boa convivência e cuidados com todos os filhos, administrar e construir a amorização e amizade entre os novos membros da família. Vale lembrar que pais felizes e equilibrados geram filhos felizes e seguros.
Os filhos sofrem com a separação e divórcio dos pais, sentem saudades, abandono, tristeza, mágoa, medo e muita incerteza em relação ao futuro, o que é normal no primeiro ano e pode durar até 5 anos após a separação. Quando os pais partem para uma segunda união, repete-se o processo de angustia na expectativa que tudo se repita, além de ainda haver a esperança na reconciliação dos pais. Os filhos maiores costumam encarar com mais frieza a segunda união, e torna-se mais fácil quando os filhos compreendem o que aconteceu e concordam com a separação dos pais, pois não aguentam mais os conflitos. No entanto, nada impede as crises de ciúmes, a competição e o sentimento de rejeição quando os pais unem-se a outros. Outro conflito que pode ocorrer na criança é o da lealdade, ou seja, quando gosta do(a) novo(a) companheiro(a) do pai ou da mãe e sente que está traindo o pai ou a mãe.
Filhos de pais em segunda união estão numa situação complexa e desafiadora, que pode ser amenizada com atenção, afeto e estabilidade no novo relacionamento. É imprescindível deixar claro para os filhos que acabou o relacionamento do casal, mas não o relacionamento pai e mãe para com eles.
É na família que vivemos as maiores alegrias e também as maiores dificuldades da vida, nela está o compromisso de acolher, cuidar, defender e acompanhar os filhos desde a concepção até a morte. Tudo isto implica numa constante dinâmica, ou seja, CONSTRUÇÃO E RECONSTRUÇÃO das relações famíliares, sejam elas quais forem.
(*) Marlene de Fátima Merege Pereira – Escola de Pais – Seccional de Curitiba/PR